A emoção é como um pássaro,
quando se prende já não canta

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Quem te ensinou?

Quem te ensinou o segredo
e a forma de assim colorir?
Quem te criou o perfume?
Quem te fez sorrir?
( O seio assim despojado
o corpo e a voz sem brilhar
silêncio de todas as cores
domínio da luz sobre o tempo).
Quem te vivei os momentos
de desespero e abandono
ao ar, ao sol – teus lamentos?
Quem te sofreu as tragédias
sob mão assassina e lasciva?
Quem te sentiu os instantes
de morte, paz e miséria?

No jarro inútil – prisão colorida,
já não és mais a mesma voz.
O seio murchou e o perfume
desfez-se. Ninguém reparou.
Que te fará outra vez?


Fernando Py

Os mensageiros



A palavra de um caracol em folha a servir de prato?
Não é minha. Não a aceitem.

Ácido asséptico em frasco selado?
Não o aceitem. Não é genuíno.

Um anel de oiro com o sol lá dentro?
Mentiras. Mentiras e dor.

Gelo numa folha, o caldeirão
Imaculado, que fala e crepita

Sozinho, no cimo de cada um
Dos nove Alpes negros.

Uma agitação nos espelhos,
O mar despedaça o mar cinzento –

Amor, amor, o meu tempo.

Sylvia Plath

Com você

Se for com sol, eu topo
uma tarde curtindo a tarde
deitados na grama do parque
e vinho, e queijo, e beijo.

Se for com lua, eu topo
uma dose de desejo no copo
um cheiro de noite no corpo
e lençol, e pele, e suor.

Se for com você, eu topo
uma casinha azul no campo
um vaso de gérbera no canto
e rede, e quintal, e dengo.




Bertold Brecht

Sôbre estrelas

Deitada na grama, o céu empoeirado de estrelas.
Passei o dedo e - curioso -
algumas vieram grudadas na ponta.
Olhei para cima e assoprei.
Foi tanta estrela caindo
que agora eu mal consigo enxergar
 de tanta esperança." 


Rita Apoena

Pensamento

Tela de Ayala Gadeh
Deus nos dá pessoas e coisas, 
para aprendermos a alegria... 
Depois, retoma coisas e pessoas
 para ver se já somos capazes da alegria sozinhos...
Essa... a alegria que ele quer...
-
(João Guimarães Rosa)

Frase


Tela de Ayala Gadeh

A ausência diminui as pequenas paixões e aumenta as grandes,
 da mesma forma como o vento apaga as velas e atiça as fogueiras.

(François de La Rochefoucault)

Não somos assim

Não somos fortes e poderosas todos os dias... 
Que choremos se preciso for,
que sintamos o amor e o desabrochar
de uma flor que um dia foi semente... 
E que renasçamos sim...
Se preciso for... 
Diariamente".


Carolina Salcides

Soneto IV

Tela de Pino Daeni
soneto IV

Vagueiam suavemente os teus olhares
Pelo amplo céu franjado em linho:
Comprazem-te as visões crepusculares...
Tu és uma ave que perdeu o ninho.

Em que nichos doirados, em que altares
Repoisas, anjo errante, de mansinho?
E penso, ao ver-te envolta em véus de luares,
Que vês no azul o teu caixão de pinho.

És a essência de tudo quanto desce
Do solar das celestes maravilhas...
Harpa dos crentes, cítola da prece...

Lua eterna que não tivesse fases,
Cintilas branca, imaculada brilhas,
E poeiras de astros nas sandálias trazes...

Alphonsus de Guimarães



Coração de namorado


Não sei de quantos corações me veio feito
meu coração diverso intensamente amado 
ou de quantas guitarras de vibrar no peito
veio-me feito o coração de um namorado!

Não sei de quantos beijos pode ser refeito
um beijo que restou presente do passado. 
Ou com quantos abraços restaurar o jeito
de o coração fingir que estava enamorado.

Deixe um pedaço de um poema na janela
diz que a última rosa sobre a mesa é dela
e deixe-a acreditar no que o amor lhe diz...

Põe teus lençóis de estrelas nos telhados
estilhaços de luz no chão dos namorados
se é falta de razão que deixa o amor feliz...

Afonso Estebanez

Luzes

Eu sei a lua, o sol e a cor dos teus cabelos,
quando na noite a estrela vem me brilhar versos.
E a cada linha e a cada ponto, em teus reflexos,
transcendo a dor e acendo as letras de escrevê-los.

Misteriosa brisa acalenta as imagens
e nas manhãs despertam rimas no teu corpo.
No cais, um barco atraca sonhos no meu porto,
o mesmo sol, a mesma lua... E essas miragens.

Eu sei o veio e o rio da paixão que emboca
águas de cachoeiras, lua, sol e os medos.
Eles espelham luzes de um beijo na boca.

Sei um poeta e, agora, as penas destes dedos
voam nas folhas brancas de estrelas — gaivotas —,
para que à noite eu durma em paz, com meus segredos.

Nathan de Castro. 

Recordarás

Recordarás aquela quebrada caprichosa
onde os aromas palpitantes subiram,
de quando em quando um pássaro vestido
com água e lentidão: traje de inverno.

Recordarás os dons da terra:
irascível fragância, barro de ouro,
ervas do mato, loucas raízes,
sortílegos espinhos como espadas.

Recordarás o ramo que trouxeste,
ramo de sombra e água com silêncio,
ramo como uma pedra com espuma.

E auqela vez foi como nunca e sempre:
vamos ali onde não se espera nada
e achamos tudo o que está esperando."


Pablo Neruda

São de Areia

Na balada de meu coração surfa um sorriso 
ainda molhado pelas águas de março daquele verão...
Arrepia meu corpo ainda salgado o gosto do riso
esparramado nas areias mornas de então...
Não são só lembranças, são tatuagens, 
marcas que ficaram coladas n’alma como grãos d’areia...
São elos que não se rompem, são fontes
que jorram de mim para o mar querendo te amar...
Podes constar como saudade, infinitas que são,
me apertam os olhos e me põem a pensar...
Chorar nunca, pois são resto de risos que ainda ecoam
na concha vazia de meu coração!


Santaroza

A Carta

(“As cartas de amor são ridículas...” Fernando Pessoa)

Ouso dizer-te, meu amor, 
que tua ausência é uma mesma carência de mim.
Nossos eus se emaranham e já não sei em que ponto me quedo,
 em que ponto te levantas.
A que limite sou eu que te busco, ou tu que me alcanças?
Quando prosa ritmada, quando verso sem pé? 
Faca ou colher? Abissal ou vazante de maré? 
Quando manha, quando ferida? 
Onde pecado, onde pudor?
Em que berço com teus sonhos me deito?
Com meus sonhos te despertas em que leito?
Cara ou metade? Lucidez ou enfermidade?
Se resquício de ti, se memória de mim, já o que importa?
Onde defeito , onde um querer-te assim mais que perfeito, sem fim?


Fernando Campanella

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

O sal da língua

Escuta, escuta: tenho ainda
uma coisa a dizer.
Não é importante, eu sei, não vai
salvar o mundo, não mudará
a vida de ninguém - mas quem
é hoje capaz de salvar o mundo
ou apenas mudar o sentido
da vida de alguém?
Escuta-me, não te demoro.
É coisa pouca, como a chuvinha
que vem vindo devagar.
São três, quatro palavras, pouco
mais. Palavras que te quero confiar,
para que não se extinga o seu lume,
o seu lume breve.
Palavras que muito amei,
que talvez ame ainda.
Elas são a casa, o sal da língua.


Eugénio de Andrade

Tu vientre

Tu vientre sabe más que tu cabeza
y tanto como tus muslos.
Ésa
es la fuerte gracia negra
de tu cuerpo desnudo.

Signo de selva el tuyo,
con tus collares rojos,
tus brazaletes de oro curvo,
y esse caimán oscuro
nadando en el Zambeze de tus ojos.



Nicolás Guillén

Pode alguém dizer-me?

Pode alguém dizer-me
até onde vai a minha vida?
Sou um sopro na tempestade,
uma onda no lago?
Ou serei, talvez,
essa branca e pálida bétula
arrepiada de primavera

Rainier maria Rilke

A velha chácara




 A casa era por aqui...
Onde? Procuro-a e não acho.
Ouço uma voz que esqueci:
É a voz deste mesmo riacho.

Ah quanto tempo passou!
(Foram mais de cinquenta anos.)
Tantos que morte levou!
(E a vida... nos desenganos...)

A usura fez tábua rasa
Da velha chácara triste:
Não existe mais a casa...

— Mas o menino ainda existe.

Manuel Bandeira 

En primavera

Todo ha florecido en estos campos,
manzanos, azules titubeantes,
malezas amarillas, y entre la hierba verde
viven las amapolas.
El cielo inextinguible,
el aire nuevo de cada día,
el tácito fulgor,
regalo de una extensa primavera...

Pablo Neruda

Sê bom... mas




Sê bom. Mas ao coração
Prudência e cautela ajunta.
Quem todo de mel se unta,
Os ursos o lamberão.


Mario Quintana

Bastava-nos amar

Tela de Michael Garmash
Bastava-nos amar. E não bastava
o mar. E o corpo? O corpo que se enleia?
O vento como um barco: a navegar.
Pelo mar. Por um rio ou uma veia.
Bastava-nos ficar. E não bastava
o mar a querer doer em cada ideia.
Já não bastava olhar. Urgente: amar.
E ficar. E fazermos uma teia.
Respirar. Respirar. Até que o mar
pudesse ser amor em maré cheia.
E bastava. Bastava respirar
a tua pele molhada de sereia.
Bastava, sim, encher o peito de ar.
Fazer amor contigo sobre a areia.

Joaquim Pessoa (poeta português)

A canção da espera

Tela de Johanna Harmon
Quando deixares meu desavisado coração
não esqueças de deixar a luz da lua acesa.
Deixa a chave da esperança sobre a mesa
do quarto onde dormiu teu último verão.

Não te esqueças das romãs do teu outono
só porque as sombras do inverno te virão
como lembranças de um amor de ocasião
que não conciliava mais o próprio sono.

Talvez eu me adormeça aqui para sonhar
com o outro lado temporão da primavera
onde eu sonhar me seja estar à tua espera
doendo de um retorno de qualquer lugar.

Estarei dividindo com as águas do riacho
uma breve canção de prazer e sofrimento
sobre a vida refeita de pena sem lamento
o coração envolto no seu próprio abraço.


Afonso Estebanez

Cuidado

Ó namorados que passais, sonhando, 
quando bóia, no céu, a lua cheia! 
Que andais traçando corações na areia
e corações nos peitos apagando! 

Desperta os ninhos vosso passo... E quando
pelas bocas em flor o amor chilreia, 
nem sei se é o vosso beijo que gorjeia, 
se são as aves que se estão beijando... 

Mais cuidado! Não vá vossa alegria
afligir tanta gente que seria
feliz sem nunca ouvir nem nunca ver! 

Poupai a ingenuidade delicada
dos que amaram sem nunca dizer nada, 
dos que foram amados sem saber! 


Guilherme de Almeida

O Provedor

Andar à toa é coisa de ave.
Meu avô andava à toa.
Não prestava pra quase nunca.
Mas sabia o nome dos ventos
E todos os assobios para chamar passarinhos.
Certas pombas tomavam ele por telhado e passavam
as tardes frequentando o seu ombro.
Falava coisas pouco sisudas: que fora escolhido para
ser uma árvore.
Lírios o meditavam.
Meu avô era tomado por leso porque de manhã dava
bom-dia aos sapos ,ao sol,às águas.
Só tinha receio de amanhecer normal.
Penso que ele era provedor de poesia como as aves
e os lírios do campo.

Manoel de Barros

Ama-me somente

Tela de Johanna Harmon

Ama-me por amor do amor somente
Não digas: "Amo-a pelo seu olhar,
O seu sorriso, o modo de falar
Honesto e brando. Amo-a porque se sente

Minh'alma em comunhão constantemente
Com a sua." Porque pode mudar
Isso tudo, em si mesmo, ao perpassar
Do tempo, ou para ti unicamente.

Nem me ames pelo pranto que a bondade
De tuas mãos enxuga, pois se em mim
Secar, por teu conforto, esta vontade

De chorar, teu amor pode ter fim!
Ama-me por amor do amor, e assim
Me hás de querer por toda a eternidade.

Elizabeth Barrett Browning

Sou o segredo





Sou o pensamento.
O vento soprando forte.
O barco da sorte.
O sorriso da alegria.
A força da magia.
A dor do fraco.
O segredo do forte.
O medo da vida.


Guimarães Rosa
Sobe até o cimo da manhã.
É lá que deves esperar-me,
grande intervalo de silêncio
musicado e fresco,
até que eu me liberte
do terror das palavras sedentárias
e aprenda, irmão mais novo dos insetos,
a linguagem perfumada das flores.

Albano Martins

Visão campesina

Tela de Edward Cucuel
Que mimosa casinha emoldurada
De baunilhas em flor ! Um doce ninho...
Murmureja um regato, ali pertinho,
Ri-se a campina verde e perfumada.
Não lhe falta o cantar de passarinho,
Numa orquestra de amor bem afinada,
Que me faz esquecer o torvelinho
Dessa vida de praça emocionada.
O céu sereno e azul... Faceira a brisa,
Aqui tudo me enleva e, alegre sinto
Que o tempo mansamente se desliza.
Uma casinha só ! Qualquer cidade
Por ela não trocara... Em seu recinto
Gozei do bem a paz, a suavidade!

Francisca Clotilde

Oração


"Senhor, fazei com que eu aceite
minha pobreza tal como sempre foi.
Que não sinta o que não tenho.
Não lamente o que podia ter
e se perdeu por caminhos errados
e nunca mais voltou.
Dai, Senhor, que minha humildade
seja como a chuva desejada
caindo mansa,
longa noite escura
numa terra sedenta
e num telhado velho.
Que eu possa agradecer a Vós,
minha cama estreita,
minhas coisinhas pobres,
minha casa de chão,
pedras e tábuas remontadas.
E ter sempre um feixe de lenha
debaixo do meu fogão de taipa,
e acender, eu mesma,
o fogo alegre da minha casa
na manhã de um novo dia que começa.


Cora Coralina

Tua voz

Tela de Pino Daeni
Tua voz tem o encanto 
de mil borboletas azuis,
traçando bordados no ar.
Tua voz me fala de coisas
que o vento esqueceu,
segredos de primaveras,
cantigas de ninar sereias,
frases que murmuramos
quando nos faz falta o mar.

Alvaro Bastos


Retrato de menina

Retrato de menina
Os cabelos, não.
Tampouco olhos.
Nada além do sorriso: pedras 
que as palavras atravessam rápidas
como lagartos, muro
onde encostar meu cansaço.

Eucanaã Ferraz

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

O poeta pede ao seu amor que lhe escreva

Tela de Franz Vervloet
Amor de minhas entranhas, morte viva, 
em vão espero tua palavra escrita 
e penso, com a flor que se murcha, 
que se vivo sem mim quero perder-te. 
O ar é imortal. A pedra inerte 
nem conhece a sombra nem a evita. 
Coração interior não necessita 
o mel gelado que a lua verte. 
Porém eu te sofri. Rasguei-me as veias, 
tigre e pomba, sobre tua cintura 
em duelo de kordiscos e açucenas. 
Enche, pois, de palavras minha loucura 
ou deixa-me viver em minha serena 
noite da alma para sempre escura. 


Garcia Lorca
(tradução: William Agel de Melo )

A meu favor

Tela de Edouard Niczky
A meu favor
A meu favor
Tenho o verde secreto dos teus olhos
Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor
O tapete que vai partir para o infinito
Esta noite ou uma noite qualquer

A meu favor
As paredes que insultam devagar
Certo refúgio acima do murmúrio
Que da vida corrente teime em vir
O barco escondido pela folhagem
O jardim onde a aventura recomeça.

A meu favor tenho uma rua em transe
Um alto incêndio em nome de nós todos


Alexandre O'Neill

Que sabes tu do fim

Tela de Dante Gabriel Rosseti


"Goza a euforia do vôo do anjo
perdido em ti.
Não indagues se nessas estradas,
tempo e vento, desabam no abismo
Que sabes tu do fim?
Se temeres que teu mistério seja uma noite,
encha-o de estrelas.
Conserva a ilusão de que teu vôo te
leva sempre para mais alto.
No deslumbramento da ascenção.
Se pressentires que amanhã estarás mudo,
esgota, como um pássaro as canções que
tens na garganta. Canta...
Canta para conserva uma ilusão de
festa e de vitória.
Talvez as canções adormeçam as feras,
que esperam devorar o pássaro.
Desde que nasceste não és mais do que
um vôo no tempo. Rumo do céu?
Que importa a rota. Voa e canta
enquanto resistirem as asas!"


Menotti del Picchia

Sacode as nuvens

Sacode as nuvens que te poisam nos cabelos,
Sacode as aves que te levam o olhar.
Sacode os sonhos mais pesados do que as pedras.

Porque eu cheguei e é tempo de me veres,
Mesmo que os meus gestos te trespassem
De solidão e tu caias em poeira,
Mesmo que a minha voz queime o ar que respiras
E os teus olhos nunca mais possam olhar.


Sophia de Mello Breyner

domingo, 26 de dezembro de 2010

Fantasia



Na minha rua há uma casa que canta
e junto à porta, um vaso de petunias
que toca violino divinamente.
No jardim as árvores dançam como bailarinas
e um duende verde fica na entrada cobrando os ingressos.
Mas ninguém acredita...

Mariza Alencastro

Os cisnes selvagens de Coole

Em sua outonal beleza estão as árvores,
Secas as veredas do bosque;
No crepúsculo de Outubro as águas
Reflectem um céu tranquilo;
Nessas transbordantes águas sobre as pedras
Banham-se cinquenta e nove cisnes.

Dezenove outonos se passaram desde que
Os contei pela primeira vez;
E, enquanto o fazia, vi
Que de repente todos se erguiam
E em largos círculos quebrados revolteavam
As clamorosas asas.

William Butler Yeats

Versos escritos em desalento


Quando é que eu vi pela última vez 
Os olhos verdes redondos e os corpos longos vacilantes 
Dos leopardos escuros da lua? 
Todas as bruxas selvagens, aquelas senhoras muito nobres, 
Por todas as suas vassouras e as suas lágrimas, 
Suas lágrimas de raiva, fugiram. 
Os santos centauros das colinas desapareceram; 
Não tenho nada para além do amargado sol; 
Banida mãe lua heróica e desaparecida, 
E agora que cheguei aos cinquenta anos 
Tenho que aguentar o tímido sol.

William Butler Yeats

Sob os teus pés

SOB OS TEUS PÉS

Tivesse eu as roupas bordadas do paraíso
tecidas com luz dourada e prateada
o azul e o escuro e os negros panos da noite
e a luz e as metades-luzes.
Eu espalharia essas roupas sob os teus pés.

Mas, sendo pobre, tenho apenas os meus sonhos.
Eu tenho espalhado os meus sonhos sob os teus pés.
Por isso, pise suavemente; afinal, você está andando sobre os meus sonhos.

William Butler Yeats


As pontes de Madison

As Pontes de Madison é uma adaptação do famoso romance The Bridges of Madison County, de Robert James Waller, que supostamente é baseado em uma história real. Mais do que surpreender o espectador, que talvez nunca esperasse uma história de amor contada com tanta soberba e maestria por um dos heróis da classe western, As Pontes de Madison encanta por retratar o amor na idade adulta, quando pouco de nós espera alguma coisa a mais da vida, quando nossos sonhos de adolescência foram esquecidos, e a lembrança de que um dia sonhamos é algo que nos faz analisar e questionar toda uma existência. Quase ao final do filme, quando Francesca pede aos filhos que aceitem seu último desejo, dizendo que deu sua vida à família, e quer deixar para Robert o que restou dela, é impossível não entregar os pontos, as lágrimas, o coração e a alma para Clint Eastwood. Ele conseguiu algo que poucos conseguem: retratar o amor sem ser piegas ou cínico ou vingativo. E com isso, conseguiu filmar uma pequena obra-prima, mais uma de seu excelente currículo como cineasta, um filme que você precisa ver. 

Marcelo Costa

Alguns filmes imperdíveis

ENTRE DOIS AMORES - Meryl Streep e Robert Redford

TOMATES VERDES FRITOS -Kathy Bates,  Mary Stuart Masterson, Jessoca Tandy

Dr. JIVAGO  - Omar Sharif e Julie Cristie

JUDE - Kate Winslet e Christopher Eccleston

TARDE DEMAIS PARA ESQUECER -Deborah Kerr e Cary Grant

ELZA E FRED - China Zorrila e manuel Alexandre

PÃO E TULIPAS -Licia Maglietta, Bruno Ganz

VOLVER- Penélope Cruz, Carmen Maura, Lola Dueñas.

PRISCILA, A RAINHA DO DESERTO - Terence Stamp, Hugo Weaving, Guy Pearce

DESENCANTO -  Trevor Howard e Celia Johnson

sábado, 25 de dezembro de 2010

Poeminha amoroso

Este é um poema de amor 
tão meigo, tão terno, tão teu... 
É uma oferenda aos teus momentos 
de luta e de brisa e de céu... 
E eu, 
quero te servir a poesia 
numa concha azul do mar 
ou numa cesta de flores do campo. 
Talvez tu possas entender o meu amor. 
Mas se isso não acontecer, 
não importa. 
Já está declarado e estampado 
nas linhas e entrelinhas 
deste pequeno poema, 
o verso; 
o tão famoso e inesperado verso que 
te deixará pasmo, surpreso, perplexo... 
eu te amo, perdoa-me, eu te amo... 


Cora Coralina

De dia

De dia, entre os veludos e entre as sedas, 
Murmurando palavras aflitivas, 
Vagueia nas umbrosas alamedas
E acarinha, de leve, as sensitivas. 

Fosse eu aquelas árvores frondosas, 
E prendera-lhe as roupas vaporosas. 


Cesário Verde

Se não falas

Se não falas, vou encher o meu coração
Com o teu silêncio, e agüentá-lo.
Ficarei quieto, esperando, como a noite
Em sua vigília estrelada,
Com a cabeça pacientemente inclinada.


A manhã certamente virá,
A escuridão se dissipará, e a tua voz
Se derramará em torrentes douradas por todo o céu.


Então as tuas palavras voarão
Em canções de cada ninho dos meus pássaros,
E as tuas melodias brotarão
Em flores por todos os recantos da minha floresta. 

RABINDRANATH TAGORE

Borboletas brancas

Como posso dizer que voam
as borboletas de traje branco
que saltitam na primavera?

Dão laços na cor do vento
e são alegres como quem tem
mil gotas de néctar à espera.

Pétalas gêmeas de seda breve,
Borboletas bordam o destino
floreando os novos caminhos.

Seu vôo flui como leve sorriso
e volteia na melodia da brisa,
são as garatujas dos meninos.

São como silêncio em movimento,
de quem escuta o mel das flores,
as borboletas do meu carinho.

Alvaro Bastos

Se partires


Se partires, não me abraces – a falésia que se encosta
uma vez ao ombro do mar quer ser barco para sempre
e sonha com viagens na pele salgada das ondas.

Quando me abraças, pulsa nas minhas veias a convulsão
das marés e uma canção desprende-se da espiral dos búzios;
mas o meu sorriso tem o tamanho do medo de te perder,
porque o ar que respiras junto de mim é como um vento
a corrigir a rota do navio. Se partires, não me abraces –

o teu perfume preso à minha roupa é um lento veneno
nos dias sem ninguém – longe de ti, o corpo não faz
senão enumerar as próprias feridas (como a falésia conta
as embarcações perdidas nos gritos do mar); e o rosto
espia os espelhos à espera de que a dor desapareça.
Se me abraçares, não partas.

Maria do Rosário Pedreira

A Vida


Tela de Christa Kieffer


Na água do rio que procura o mar;
No mar sem fim; na luz que nos encanta;
Na montanha que aos ares se levanta;
No céu sem raias que deslumbra o olhar;

No astro maior, na mais humilde planta;
Na voz do vento, no clarão solar;
No inseto vil, no tronco secular,
— A vida universal palpita e canta!

Vive até, no seu sono, a pedra bruta . . .
Tudo vive! E, alta noite, na mudez
De tudo, — essa harmonia que se escuta

Correndo os ares, na amplidão perdida,
Essa música doce, é a voz, talvez,
Da alma de tudo, celebrando a Vida!

Olavo Bilac

Imaginação

Tela de Daniel F. Gerhartz

A imaginação é magia e é arte
que nos faz inventar, sonhar e viajar.
Com imaginação podemos ir a Marte
ou ao centro da Terra, ou ao fundo do mar.
Com imaginação nunca estamos sozinhos.
A imaginação é um voo, um lugar
onde temos amigos, onde há outros caminhos
nos quais, sem te mexeres, podes ir passear.
Inventa uma cantiga, um poema, um desenho
um arco-íris, um rio por entre malmequeres;
esse lugar é teu, sem limite ou tamanho.
A esse teu lugar, só vai quem tu quiseres.


Rosa Lobato Faria

Canção do amor-perfeito

Tela de Daniel F.Gerhartz
Eu vi o raio de sol
beijar o outono.
Eu vi na mão dos adeuses
o anel de ouro.
Não quero dizer o dia.
Não posso dizer o dono.

Eu vi bandeiras abertas
sobre o mar largo
e ouvi cantar as sereias.
Longe, num barco,
deixei meus olhos alegres,
trouxe meu sorriso amargo.

Bem no regaço da lua,
já não padeço.
Ai, seja como quiseres,
Amor-Perfeito,
gostaria que ficasses,
mas, se fores, não te esqueço.

Cecília Meireles

Fundamental


Canta
Saudade é tanta
Não vai passar se você cantar
Mas quanto mais se canta
Mais vontade de cantar
Dança, é só mudança
Não vai parar se você dançar
Mas quando você dança
É você quem vai mudar
Sonha como criança
Ainda dói se você sonhar
Mas pra que a gente acorde
É fundamental sonhar.

Alice Ruiz 

Deus disse

Deus disse: Vou ajeitar a você um dom:
Vou pertencer você para uma árvore.
E pertenceu-me.
Escuto o perfume dos rios.
Sei que a voz das águas tem sotaque azul.
Sei botar cílio nos silêncios.
Para encontrar o azul eu uso pássaros.
Só não desejo cair em sensatez.
Não quero a boa razão das coisas.
Quero o feitiço das palavras.

(Manoel de Barros)

A canção da saudade


Que tarde imensa e fria!
Lá fora o vento rodopia...
Dança de folhas... Folhas, sonhos vãos,
que passam, nesta dança transitória,
deixando em nós, no fundo da memória,
o olhar de uns olhos e a carícia de umas mãos.

Ante a moldura de um retrato antigo,
põe-se a gente a evocar coisas emocionais.
Tolda-se o olhar, o lábio treme, a alma se aperta,
tudo deserto... a vide em torno tão deserta
que vontade nos vem de sofrer mais!

Depois, há sempre um cofre e desse cofre
tiramos velhas cartas, devagar...
É a volúpia inervante de quem sofre:
ler velhas cartas e depois chorar.
Que tarde imensa e fria!

Nunca mais te verei... Nunca mais me verás...
Lá fora o vento rodopia...
Que desejo me vem de sofrer mais!

(Olegário Mariano)